quarta-feira, setembro 25, 2013

Ficções Científicas e Fantásticas


Edições Chimpanzé Intelectual

Portugal é um país inclemente para os fãs de Ficção Científica, com um panorama editorial de edições de obras traduzidas quase inexistente, salvo honrosas excepções, e um núcleo importante de bons autores nacionais de FC que vai publicando quando tem raras oportunidades. Resta ao amante da literatura que ousa pensar em frente limitar-se às edições estrangeiras, à importação de livros e correr para as livrarias sempre que surge algo de novo editado por editoras nacionais. O que, como bem sabemos, é raro, apesar dos esforços das comunidades de fãs e as suas inúmeras mas pontuais iniciativas.

Antologias de contos de FC são obras perfeitamente banais em mercados onde a FC assume importância comercial. Banais não pelos conteúdos mas pela elevada quantidade de obras disponíveis. Estas assumem muitas vezes o papel de divulgadoras de novos autores, reunindo obras de autores mais consagrados com contos de autores desconhecidos. Mas isso é noutros lados. Cá pelos nossos,sempre que alguma coisa nova sai para os escaparates até se lançam foguetes.

Editada em 2006 pela Chimpanzé Intelectual, a antologia Ficções Científicas e Fantásticas reúne contos de FC e Fantástico de autores portugueses, provando, mais uma vez, que existe uma vibrante comunidade de autores que se dedicam estoicamente à FC como forma de expressão literária. Fiel ao espírito das antologias, reúne contos de autores consagrados de FC e Fantástico com contos de outros autores, geralmente ligados às andanças de literaturas mais convencionais que para esta antologia deram uma mãozinha ou desencantaram experiências do fundo da gaveta.

Entre os autores que dedicam a sua carreira à literatura fantástica, destacam-se as excelentes contribuições de David Soares, o escatológico Allan Poe dos tempos contemporâneos portugueses, Luís Filipe Silva, cuja prosa concisa nunca deixa de me surpreender pela clareza, e João Barreiros, possivelmente o grande mestre da FC portuguesa, com os seus habituais maquiavelismos imaginativos. Autores menos conhecidos, como Miguel Vale de Almeida e Miguel Neto, mostram novas promessas da literatura fantástica nacional, talvez ainda a precisar de alguns acertos, mas a abrir o apetite para novas experiências. Já nas contribuições de autores ligados a outros géneros literários, nota-se um certo espírito leve que trai uma profunda falta de seriedade que se traduz uma abordagem light à literatura fantástica. Nota-se nos contos de Rui Zink e Clara Pinto Correia, e é perfeitamente assumida no puro nonsense de Manuel João Vieira. Surpreendeu a contribuição de Luísa Costa Gomes, uma autora que eu imaginava a anos-luz (trocadilho propositado) das literaturas fantásticas, com um conto assumido como uma juvenilia, etiqueta que caracteriza bem a percepção cultural sobre a literatura fantástica.

É talvez mal nacional este desinteresse pelo que ultrapassa a normalidade, nos faz pensar em frente, desperta a luxúria pelo futuro, que para passar do imaginário ao real só necessita da nossa vontade e engenho. É um estado de alma nacional, e não creio que chuvas de computadores ou programas governamentais de intervenção o possam, algum dia, mudar. Registos como o Ficções Científicas e Fantásticas ou outras obras semelhantes afirmam que em portugal ainda há vontade de fazer qualquer coisa diferente.

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